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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Capítulo 4 - Será?

(Desculpem a mudança na fonte, mas não consegui de jeito nenhum colocar a anterior.)
   
    Abri os olhos na manhã seguinte. Fiquei olhando para o teto, estranhei ao abrir os olhos, afinal, quem nunca acordou na casa de outra pessoa e se surpreendeu por que havia esquecido de que não estava em casa? Era exatamente isso que eu havia sentido. Jurava que quando abrisse os olhos estivesse em casa, mas observei, e lembrei de que estava na casa de meu avô. Eu lembrei de tudo que havia acontecido na noite anterior, e uma estranha sensação de que tudo havia sido um sonho tomou conta de mim, mas ao olhar para o lado, ali estava ele, deitado, dormindo, feito um anjo, e me dei conta de que nada foi um sonho, tudo foi verdade. Nos beijamos.
    Me levantei da cama depois de muito tempo refletindo comigo mesma. Eu sempre, na casa das outras pessoas, demorava para levantar da cama porque não sabia se todo mundo estava dormindo ainda, nunca sabia direito se devia levantar ou esperar mais. Mas deixei pra lá isso tudo após perceber movimentos na cozinha. Eu comecei a procurar meus chinelos pelo quarto, não achava de modo algum, fazendo tudo isso e ás vezes dando uma olhada no Jun, para ver se ele estava acordado. Até que ele abriu os olhos e eu o percebi acordado, ele pôs a cabeça angelicalmente no travesseiro, daquele jeito, com o queixo apoiado no travesseiro e os olhos verdes me observando. Algo que faria qualquer manhã ficar melhor. Ele sorriu, era uma expressão diferente que ele tinha no rosto, um expressão suave. 
    Ele sorriu com os olhos pra mim, e eu sorri durante menos de um ou dois segundos, um sorriso nervoso, acho que nem poderia ser chamado de sorriso. Completamente sem jeito, eu não o encarava, tentava ao máximo não ter que olhar para aqueles lindos olhos.
    —Você viu meu chinelo?—Perguntei, ridiculamente. Como ele saberia se acabara de acordar? Refleti muito depois de ter perguntado isso a ele.
    —Não.
    Ele se levantou e começou a procurar comigo. Até que finalmente achamos.
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    Estávamos todos sentados, o almoço estava servido. Eu sempre me senti desconfortável fazendo qualquer tipo de refeição na casa de outras pessoas. Normal ou não, assim era eu. Mas naquele momento, naquela mesa, eu sentia a mais do que em qualquer outra casa. Ele estava sentado logo ali, perto de mim, mas não ao meu lado. Olhei para ele em um reflexo e não olhei mais. Me servi e comecei a comer, não olhando pra ninguém. Eu mastigando, quase conseguia ver eu mesma ali. Rolava de vez em quando umas conversas, meu avô e a mulher dele sempre tinham algo pra perguntar comentar ou brincar. Meu irmão mais novo, sempre falava algo também. 
    Logo depois de toda a refeição, todos ficamos ali na área do lado de fora da casa. Eu brincava um pouco com o pequeno Emerson, na areia, ali ou aqui. Onde ele estivesse eu estava.
    Eu sempre fui conhecida, principalmente por minha mãe, por gostar muito de crianças e ter uma paciência sem tamanho. Sempre fui assim, cuidava sempre dos filhos das amigas da minha mãe, brincava, e divertia. O problema é quando eles choravam, eu não era tão boa em saber o que fazer nessas horas.
    Brinquei por um longo tempo com ele por ali, e quando o Jun aparecia ali por perto, como de costume, eu desviava o olhar instantaneamente.
    Meu avô, a mulher dele e o pequeno Emerson logo a tarde, tiveram que sair para resolver algumas coisas. 
—Lavem a louça!—Disseram antes de sair.
    Eu, meus dois irmãos e o Jun ficamos. 
    E iríamos tomar banho numa espécie de piscina improvisada, não era bem uma piscina, mas poderia ser chamada assim. Eu coloquei meu biquíni azul, que só tinha a parte de cima e na parte de baixo, usei um calção jeans meu, era feminino, mas nada curto. Meu irmão menor, eu e o Jun ficamos nos divertindo ali. O mais velho havia ficado jogando no computador. Um velho jogo, com uma musiquinha que ficou na minha cabeça por um longo tempo.
    Nós três ficamos ali, conversando, rindo, jogando água na cara uns dos outros. Eu observava o Jun. Tão lindo. Ás vezes ele colocava seu braço sobre o meu ombro, discretamente, pois meu irmão era novo, mas não era cego.
    —E esse braço aí hein?—Brincou meu irmão, mas perguntando algo sinceramente, em tom de deboche.
    —Ah, nós somos amigos, por acaso amigos não podem abraçar uns aos outros, hein?—Falei, deixando ele pôr seu braço no meu ombro.
    Começamos a movimentar nossas mãos bruscamente na água e ela ia alto, não deixando eu e o Jun na visão do meu irmão.
—Vai, quero ver, faz o máximo que tu puder. —Disse o Jun ao meu irmão.
    Nisso ele me dava leves beijos nos lábios, com intervalos e rápidos, pois ele podia ver a qualquer momento. Acariciava minha mão. Resolvemos sair dali e jogar um pouco de futebol.
    Eu adorava jogar futebol, mesmo não sabendo muito, mas quando me elogiavam, era a melhor coisa. Gostar desse esporte nem sempre foi fácil, pois meninos não são fáceis de lidar. No meio de uma conversa sobre futebol, eu teria o maior medo de falar algo totalmente estúpido, por isso muitas vezes nem abria a boca.
    
    Eu tentava driblar o Jun, mas ele me abraçava e roubava a bola. 
—Assim não vale!—Exclamei.
    Nós nos divertíamos.
—Vem aqui.—Chamou-me ele, querendo me segurar nos braços, e eu percebi sua intenção: Me jogar dentro da pequena piscina.
—Não... Não, por favor!—Berrei em tom de brincadeira e saí disparada, correndo para quase dentro da casa, mas ele me alcançou rapidamente, me levantou em seus braços e me deu um leve beijo na bochecha.
    Não me jogou dentro da piscina, mas me colocou ali mesmo assim e entrou.
—Devemos lavar a louça.—Lembrei.
—Eu só vou se tu me ajudar.—Disse ele. Eu sorri.
    Entramos na casa, e fizemos tudo que tínhamos que fazer. Tudo limpo, pelo menos ali em cima da pia. Assim que terminamos ele me levou mais para dentro da casa. Sentou-se e me segurou em seus braços, eu estava de pé, mas não ficava tão longe de seu rosto, apenas um pouco, pois eu não era muito alta. Ele me olhava e logo depois me dava um beijo. Tudo havia se tornado mais natural pra mim naquele momento. O beijo dele era algo que me tirava os pés do chão. O beijo dele. Não era um beijo qualquer. Era o beijo. Naquele momento, não tocou só meus lábios. Mas também meu coração.
    Depois de tudo isso, resolvemos então colocar as mãos a obra, pois a qualquer momento eles poderiam chegar, e não queríamos que nos pegassem aos beijos. Estávamos então arrumando as coisas: Ele organizando o quarto do meu avô e da mulher dele, e eu organizando o quarto dele. Eu arrumava aquele típico quarto de menino adolescente . Eu coloquei alguns móveis pra cima e comecei a varrer. Eu podia escutar lá do quarto dele, que ele ouvia uma música alta. A música se chamava "Helena" da banda americana "My Chemical Romance". Eu adorava aquela música. Sempre assistia ao clipe em um canal de clipes musicais, e fiquei lisonjeada ao saber que compartilhávamos o mesmo gosto musical. 
    Tudo estava indo bem até que eles chegaram. Em minutos começamos a ouvir gritos, uma discussão não agradável. Eu só consegui ver o momento que o Jun havia saído do quarto, pra ver o que estava acontecendo, na rua. Saí também e vi ali, meu avô e a mulher dele, aos berros.
—Vamos crianças, eu vou levar vocês pra casa. No meio de brigas, vocês não vão ficar.—Disse o meu avô, com uma expressão desgostosa no rosto.
    A onda de frustração tomou conta de mim. Ir embora: Era algo que eu não esperava naquele momento, depois dos momentos, por mais rápidos que tenham sido com o Jun, eu não esperava ir embora. Não queria.
    Meu avô pôs nossas coisas nos carro. 
    Ao me despedir da mulher, ela me abraçou, me deu um beijo no rosto e disse:
—Não liga para o que ele tá fazendo, eu amo vocês.
    Olhei pela última vez no rosto dela e entrei no carro. Não. Eu não havia me despedido do Jun. Não sabia o porquê, talvez por não querer realmente dar um simples "tchau". Eu queria tocar seus lábios mais uma vez. Mas não podia, a única coisa que pude fazer, era observar ele através do vidro do carro enquanto saíamos dali. 
    "Será que eu o verei de novo?" pensei comigo mesma. A resposta era provavelmente positiva, pois ele era ligado ao meu avô. Não estava longe. "Será?"

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Capítulo 3 - O Início


        Eu não me sentia totalmente a vontade perto do Jun, pensava que cada erro que eu cometesse, seja mesmo ao andar, ele iria perceber. Mas lá, eu me sentia em casa. Havia um pátio extenso, a casa tinha uns detalhes em vermelho, agradável ao meu ver.
       Meu avô conviveu pouco com a nossa parte da família—eu, meus irmãos, mãe e meu tio—, sempre foi muito amável e carinhoso, mas viveu distante de nós. Costumava nos ligar uma vez ou outra, e nas datas especiais. De vez em quando ele aparecia de surpresa, de manhã, bem cedo, fardado. Ele vinha e dava um  beijo bem dado em nossas bochechas, e um abraço ao estilo "quebra ossos". Mas por mais que existisse a distância e a pouca convivência, o amor era enorme e nunca mudou.
      Quando ele conheceu meu irmão mais novo, ele tinha ido a nossa casa, e levou até mesmo o Jun junto. Eu tinha uns 5 ou 6 anos. Mas não foi um contato que possa se chamar de "amizade" ou algo do tipo. Jun tinha um semblante fechado, era sério, calado e grudado ao meu avô.
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       Lá na casa do meu avô mesmo que ficássemos somente em casa, havia muitas coisas para fazer, jogar futebol na rua, brincar na areia—existia um montinho de areia para construção, eu brincava com o pequeno Emerson—, mexer no computador, entre outras coisas.
       Meu irmão menor era um tanto falador, o que mais interagia com as pessoas, mas ao mesmo tempo, tinha certas dificuldades para algumas coisas, entre elas, a fala. Também, mesmo sendo pequeno, não se relacionava muito bem com, digamos, crianças mais novas que ele. Pouca paciência era o que ele tinha.
      Meu avô estava o lado de fora da casa, onde havia um pneu pendurado numa área, o chamado ''balanço de pneu''.
—Sobe aí—Disse meu avô para meu irmão menor. 
Sendo assim ele subiu, mas não se equilibrava muito bem, ficava imóvel, temia algo.
—Vamos, balança, deixa que eu balanço isso.—Disse meu avô, pronto para embalar ele ali, mas foi interrompido.
—Não!—Falava meu irmão, em um tom de incomodação.—Não vô.
     Meu avô insistia, mas não adiantava, ele não queria. Tinha medo de cair, ou algo do tipo. De tanto meu avô insistir, ele ficou bravo. Sobrancelhas baixas, bochechas infladas. Quando ele ficava chateado ou bravo, era uma figura, todo mundo achava graça, mesmo que não fosse algo que totalmente engraçado. Virava a atração, e as imitações começavam. Meu avô sorriu, entendeu e parou com a insistência.
       Chegando a noite, estávamos todos de pijama, no quarto do Jun, entusiasmados. Jun provavelmente, mesmo sendo mais velho do que nós, o espírito de criança dele, obviamente estava ali, ele estava alegre. Estávamos eu, meus irmãos, o pequeno Emerson—o neto e o Jun, ali, quietos. Meu avô deu uma olhada e nos deixou ali. Assim que ele saiu, começamos uma guerra de travesseiros, travesseiros para todos os lados, nós ríamos muito, cuidando pra não machucar de verdade, mas se divertindo. As risadas altas, mas de modo que não incomodava. Era um caindo para um lado, outro pro outro e assim ia.
      O pequeno neto do meu avô queria dormir ali no quarto com nós todos, mas o Jun começou a insistir e falar mais ríspido para ele que ele não ia dormir ali. A luz estava acesa e então Jun disse:
—Não tu não vai dormir aqui, eu vou apagar a luz. —Disse ele, fazendo exatamente isso. O pequeno ficou chateado, mas foi-se.
       Continuamos a guerrinha no escuro mesmo. Eu levava cada pancada, não doía, mas eram fortes, principalmente do Jun. E então que começaram algumas coisas curiosas. Continuávamos a guerra, mas existiam alguns momentos em que o Jun me segurava, e colocava seus braços em volta de mim. Eu fingia não me importar, e continuava querendo acertar os outros, mas ele continuava com os braços em volta de mim, e eu sentindo uma sensação estranha, não sabia muito bem explicar, mas ele me segurar daquele jeito foi algo inesperado para mim. Meus irmãos podiam ser chamados de desligados, ou que apenas, não viam nada demais naquilo.
      Tudo continuou, até que, meus irmãos já caíram no sono e eu e o Jun continuávamos a fazer a brincadeira. Apenas nós dois. Eu e ele. Eu sentia que tinha algo no ar. Eu me sentia tão boba, tão estranhamente alegre. A partir do momento que ele não queria mais a presença do pequeno do quarto, eu notei que ele planejava algo.
     Eu ia dormir na cama dele, ele em um colchão logo ao lado da cama, no chão e meus irmãos no mesmo quarto, mas um pouco mais afastados. Eu e ele estávamos perto de certa forma. A brincadeira não havia acabado nem mesmo num silêncio, e no cansaço que eu já estava. A partir de certo momento ele começava a segurar minhas mãos, as duas mãos juntas me imobilizando, na brincadeira, de poder acertar ele. Eu tentava escapar, mas ele não soltava. Eu ria, tentando no escuro achar uma forma de escapar, tentava também, poder enxergar o rosto dele, mas o escuro não deixava.
—O que eu preciso fazer pra tu me soltar? —Perguntei.
—Tente se soltar.
      Eu tentava, tentava mas não dava, eu me mexia sem parar, mas não conseguia.
—Tu precisa ficar mais calma e então eu te solto. —Disse ele.
      Eu respirei fundo e fiquei mais quieta, sem me mover, ele ainda segurava minhas duas mãos. Eu fechei os olhos e achei que ele queria que eu dormisse, e eu fingi que estava dormindo, até respirava mais profundamente, mas não era isso que ele queria. De repente, se antes ele estava segurando minhas duas mãos, naquele momento ele tinha começado a acaricia-las. Minha respiração ficou um pouco mais acelerada, abri os olhos, mas não me movia, apenas sentia que algo iria acontecer. Ele começou a beijar a minha mão e foi subindo pelo meu braço, até alcançar meus lábios. Eu levei um choque no coração, sentia meu coração na boca, e no meu pulso, como se ele estivesse sobre a pele.Eu não acreditava. Estava eu imaginando coisas? Não. Era meu primeiro beijo. Eu tinha 10 anos, ele tinha 15. Ele movia seus lábios nos meus. Eu não sabia exatamente como agir, apenas fazia o mesmo que ele. Era uma sensação boa, eu não sabia como explicar, ao mesmo tempo que me sentia indefesa, aquilo parecia que era exatamente o que eu esperava que acontecesse.
     
     O beijo então parou ele segurou o meu pulso.
—Nossa, está acelerado. —Disse ele.
—É... —Foi apenas o que consegui dizer. Eu estava meio sem jeito.
      Ele então deitou a cabeça no travesseio dele onde ele ia dormir e eu na cama onde eu ia dormir, mas virada para o lado que ele estava. Ele segurava uma de minhas mãos e a acariciava. Eu passava minha outra mão por seu rosto, acariciava como se pudesse vê-lo no escuro, ele fechava os olhos enquanto eu o acariciava. Sua pele causava certo choque nos meus dedos. Um choque diferente, bom. Sua pele suave, quente, seus lábios macios e os olhos...Os olhos. Marcantes.
—Minha mãe sabe tudo mesmo. —Falei, relembrando o que ela havia dito para o meu avô.
Ele riu. Perguntou por quê. Eu expliquei. Logo ele me beijou novamente, mas eu interrompia, porque estava com muito medo que alguém nos pegasse.
—Mas tu tem 15 anos e eu tenho só 10. —Eu falava.
—E daí? Qual é o problema? —Perguntou ele.
       Me senti boba depois de minha pergunta. Mas não fiquei com aquilo na mente.
      Nós conversamos sobre muitas coisas.
—Eu ia dar o meu primeiro beijo nu menino lá da minha rua. Mas ele queria dar um beijo em mim e logo em outra menina também, então eu desisti. —Expliquei. Eu sempre fui assim, não sabia o que era muito bem o "ficar", achava que ele ia ser só meu, mas não, era de várias. Podia ser chamada de cafona, qualquer coisa. Mas apenas ficar e nunca mais ver a pessoa. Não era minha praia. Sempre sonhei com alguém para ficar comigo para sempre. Sonhava, com o sempre.
—E então porque comigo tu aceitou? —Questionou ele.
—Eu não sei. —Menti—E tu?
—Eu gostei de ti desde que eu te vi pela primeira vez. —Disse ele. Eu sabia que ele não disse gostar de um jeito muito especial. Eu tentava não me iludir.
      Conversamos bastante. Até que eu virei meu rosto para o lado e ia tentar dormir.
—Amanhã se pudermos ficar sozinhos.... vamos nos beijar de novo? —Perguntou ele. Era mais um pedido do que uma pergunta.
—Não sei... —O medo—Vamos ver.
      Até eu fechar os olhos, a mão dele não havia saído da minha.


terça-feira, 8 de novembro de 2011

Capítulo 2 - 2006


      Eu amadureci muito com a separação dos meus pais. Eu tinha dez anos, mas sabia muito bem lidar com as coisas, era diferente, eu parecia mais velha. Sempre foi assim comigo, até hoje.
      Era verão de dezembro de 2006. Eu, sempre odiei matemática, a minha maior inimiga, e naquela época eu precisava fazer a prova da aprovação, ou seja, eu estava na quarta série, prestes a passar pra quinta, mas para passar, eu tinha que conseguir atingir a média nesta prova final de matemática. Eu iria fazer na semana seguinte, mas pelo fato de que meu avô viria para buscar eu e meus irmãos para passar uns dias lá, minha mãe pediu para que eu fizesse a prova antes, eu fiz e passei.
     Eu ia saindo de dentro da escola, e estava prestes a virar a rua pra ir pra casa, mas a mãe me chamou e apontou. O carro do meu avô estava estacionado ali, exatamente na frente da escola. Eu entrei no carro, junto de minha mãe e observei que no banco a minha frente tinha alguém desconhecido para mim, era um menino, bom, adolescente.  15 anos. E logo ao lado de minha mãe havia um menino, bem pequeno, devia ter um 2 ou 3 anos de idade, era como se fosse um neto para o meu avô.
     Minha mãe estava o meu lado, e falava com o meu avô algo como:
—Fica de olho neles hein pai. —Dizia ela, e eu pensava: Como minha mãe podia pensar em uma coisa dessas, o menino de 15 anos fazer algo com uma menina de 10? Bom, devia ser obviamente porque eu parecia maior, mas eu não tinha certeza.
     Logo depois que minha mãe disse isso, o próprio menino começou a falar. Colocando as mãos no teto do carro, eu não via o rosto dele, ainda. Apenas observava as mãos dele enquanto ele falava.
—Eu nunca vou fazer nada, olha o tamanho dela.
     Meu avô então ligou o carro e subimos em direção a nossa casa, para pegarmos as nossas coisas. Chegando lá, saímos do carro e então minha mãe foi a única a entrar em casa, para pegar nossas coisas, e nós ficamos na frente esperando ela. Foi quando eu vi o menino, de verdade.
      Olhando ele, eu ficava me sentindo meio estranha. Ele era lindo. Pele morena, olhos grandes e verdes, cabelos castanhos. Mas eu não falava nada com ele. O nome dele era Jun. Já havia visto ele quando eu tinha cerca de cinco anos, mas não tinha lembranças claras sobre isso.
      Minha mãe então voltou e colocou nossas coisas no carro. Logo ela puxou meu avô para um canto, em que o menino não pudesse ouvir nada do que ela dissesse, mas ela dizia mais ou menos a mesma coisa que havia falado no carro.
­—Pai, fica de olho nele tá bom? Ela é uma menina. Não deixa ele se passar.
    Eu sabia fingir muito bem. Eu ouvi tudo, mas não disse nada. Apenas guardei as palavras dela na minha mente.
      Entramos todos no carro, nos despedimos e seguimos viagem, rumo a Montenegro, a cidade em que meu avô viveu durante anos. Durante a viagem, eu e meus irmãos nos distraíamos com qualquer coisa, até com a camiseta do pequeno menininho, que o vento enchia e o fazia ficar inflado. Eu ficava rindo juntamente do meu irmão mais novo, e acabava por me deparar com o olhar de Jun. Para mim ele me olhava como se dissesse “Que coisa ridícula, está rindo por nada”. Então se eu estava rindo, imediatamente eu ficava séria ao me deparar com os olhos dele. Quando ele falava com o meu avô, eu apenas ouvia sua voz e observava seus movimentos.


      Finalmente chegamos a casa deles. Saindo do carro nos deparamos com duas mulheres sentadas ali fora. Uma era a esposa do meu avô, e a outra a enteada, irmã do Jun. Ambas com cabelos bem escuros. Elas nos olharam, e nos cumprimentaram. Simpáticas à primeira vista.
      Entramos na casa e guardamos nossas coisas nos armários. No quarto do Jun. Eu olhava para o Jun, mas não deixava ele ver que eu o olhava. Eu estava de certo modo encantada por ele. Ás vezes ele ficava apenas no computador, jogando, e eu ficava brincando com o netinho de meu avô, colocando ele na cama e fazendo cócegas. O Jun observava. Era eu quem estava brincando e fazendo-o rir, mas ele xingava o menino.

    Eu ficava com vergonha até mesmo na hora das refeições, eu não sabia para onde olhar. Era meio ridículo, mas eu sempre fui muito tímida com pessoas que eu não tinha muito tempo de convivência.
    Nos divertimos de diversas formas durante o dia. O Jun ficava mostrando jogos no computador ao meu irmão mais velho. Eu, meu irmão mais novo e o neto do meu avô, ficávamos jogando bola no pátio.
     Era estranho, mas eu estava sempre de alguma forma atenta ao que o Jun estava fazendo.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Capítulo 1 - A Família Guerreiro

      Naquele momento eu estava no quarto, deitada, em um beliche, na parte de cima e meus dois irmãos na parte de baixo.
      Nossa casa era bem simples, três cômodos, mas pra nós era o melhor lugar para se viver. Meu tio avô morava ali logo ao lado na outra casinha. Um senhor de cabelos brancos, resmungão, desde que eu me dou por gente, ele tem cabelos brancos. Vivia cantarolando músicas antigas, e eu e meus dois irmãos dando gargalhadas. Ele era como um segundo pai. Irmão do meu avô, cheio de irmãos, e uma irmã.
      Meu avô, um homem sempre, a vida toda, fazendo sucesso com as mulheres. Grisalho, bonitão melhor dizendo. Tinha dois filhos. Um filho e uma filha. Muito ao contrário do meu tio avô, o meu avô sempre se cuidou, e tinha um emprego estável, trabalhava na brigada militar. Viveu um longo tempo casado com minha avó. Mas logo ele se casou e parou de ser o tal mulherengo que sempre foi. Casou-se, e assim que se casou, ganhou mais um filho.  Sua mulher tinha um filho, que então, meu avô criou como se fosse seu filho.
      Minha avó. Tão linda. De baixa estatura, parecia uma boneca. Cabelos encaracolados e castanhos, pele branca. A melhor companhia que se pode ter.
      Meu tio. Sempre foi e ainda é o meu maior ídolo. Posso dizer que era mais um pai para nós. Um exemplo de pessoa, estudioso, dedicado, brincalhão e amável. Mesmo sendo mais novo do que minha mãe, sempre a ajudou muito, assim como ela o ajudou. Anjos. Tinha cabelos escuros, olhos puxados e pele branca.
      Meus dois irmãos. O mais velho foi a vida inteira, quieto, na dele, educado, ao contrário de mim. Cabelos escuros, pele morena, olhos marcantes, sorriso tímido. Meu irmão mais novo, sempre agitado, falador, igual minha mãe. Ele tinha olhos puxados, pele bem branquinha, e cabelo escorrido, cabelos lembrando muito cabelo de índio. Um ao contrário do outro.
      Eu, bom, eu sempre fui muito agitada, e sapeca. Eu mexia em tudo, estragava todos os brinquedos, em casa, porque na casa dos outros era um anjo.   Eu tinha olhos grandes, cabelos cacheados e pele branca.
      Minha mãe. Linda, sempre foi linda. Faladora, nossa, e como fala. Alta, cabelos lisos e escuros, muitas vezes pintados de loiro, mas o escuro era sempre a melhor opção. Olhos levemente puxados, pele morena, um moreno diferente do meu irmão mais velho, mas era morena.  Ela sempre foi um exemplo de vida, e de mulher de verdade pra mim. Eu nunca vi alguém como ela e acho que nunca vou ver, ela fazia de tudo. Fazia de tudo para sermos uma família feliz, a que somos hoje.
      Meu pai, bom, ele não era um guerreiro, mas de alguma forma acabava por ser considerado, já que era casado com a minha mãe. Foi do meu pai que herdei os cabelos cacheados, mas os dele eram pretos. Mas também desde que me conheço por gente, meu pai era calvo. Pele branca, olhos grandes. Ele sempre foi muito bem humorado, brincalhão, com ele, sempre tivemos altas risadas, isso o tornava mais lindo. Mas ele era muito diferente como pai, do que como era como marido.
  


 Separação
      Era noite, e eu naquele momento estava no quarto, deitada, em um beliche, na parte de cima, meus irmãos na parte debaixo. O mais novo dormindo e o mais velhos apenas observando tudo.
     Minha mãe e meu pai na cozinha.Meu pai berrava, minha mãe berrava, eu acabava berrando e as lágrimas descendo. Eu olhava pro meu irmão mais velho, ele até gritava, mas não tanto quanto eu. Eu estava de certa forma assustada, vendo as duas pessoas que mais amava ali, praticamente acabando um com o outro. As lágrimas desciam sem parar, lágrimas que eram como pesos,  terremotos, pois, tudo que foi construído, pelas duas pessoas mais importantes de nossas vidas, estava desmoronando ali, naquele momento, naquele simples lugar, que um dia já foi cheio de amor e afeto, e que agora, estava cheio de ira, de duas pessoas que naquele momento, não pareciam o casal—que nós pensávamos que era feliz . Até que meu pai se enfureceu e saiu de casa, jogando algumas coisas no chão, então eu desci da cama e fui ver como tudo estava.
     Minha mãe olhava as coisas estragadas, estava um tanto brava, mas me acalmou. E no dia seguinte tudo acabara. Minha mãe me segurou pelo braço e fomos para casa de minha avó, não para morar lá, apenas para esfriar a cabeça. Eu sempre fui muito companheira da minha mãe, sempre fiquei ao lado dela, mesmo amando muito meu pai.
    Tudo aconteceu até que meu pai saiu de casa de vez, e foi morar na casa da minha outra avó. Ficamos ali então eu, minha mãe e meus irmãos. De certa forma isso nos trouxe paz, vivemos com um pouco de dificuldade obviamente, mas existia paz.